Indenização em dinheiro das férias e licenças-prêmio do servidor público

1. O que é a licença-prêmio

licença-prêmio é um benefício concedido aos servidores públicos estatutários, consistente na obtenção de um período de folgas remuneradas, em compensação à sua assiduidade no serviço, nos termos previstos em lei.

No Estado de São Paulo, o benefício está previsto no art. 209 da Lei nº 10.261/68 que estabelece aos servidores públicos civis e militares, em suma, o direito “à licença de 90 (noventa) dias em cada período de 5 (cinco) anos de exercício ininterrupto, em que não haja sofrido qualquer penalidade administrativa”.

A rigor, portanto, o servidor público pode acumular ao longo do seu tempo de atividade funcional, períodos de licença-prêmio não usufruídos ou usufruí-los, conforme seu interesse e conveniência da administração pública.

Ocorre que, ao se aposentar, o servidor possui, muitas vezes, períodos de licença-prêmio não gozadas e, nesses casos, surge um questionamento. O servidor público que não usufruiu os afastamentos regulares a que tinha direito durante o serviço ativo na administração pública, pode requerê-los judicialmente na inatividade?

Caso seja possível, o direito do servidor prevalece mesmo nos casos em que não houve qualquer negativa da administração pública para que ele usufruísse do seu direito aos afastamentos?

Não se discute que os períodos de licença-prêmio integralizados nos termos da legislação em vigor passam a integrar o patrimônio do servidor público.

Contudo, a própria Lei nº 10.261/68 – com alterações da Lei Complementar nº 1.048/2008 -, em seu art. 213, inc. II, estabelece que o requerimento do benefício deve ocorrer até “o implemento das condições para a aposentadoria voluntária”. E mais, no mesmo art. 213, § 2º, definiu-se que”a apresentação de pedido de passagem à inatividade, sem a prévia e oportuna apresentação do requerimento de gozo, implicará perda do direito à licença-prêmio“.

Nesse sentido, a lei de regência pressupõe que o servidor público requeira o gozo da licença-prêmio antes ou simultaneamente ao seu pedido de aposentadoria voluntária.

2. Diferença entre aquisição e fruição do direito

Há que se distinguir, entretanto, duas situações: a aquisição do direito e o efetivo gozo do direito – in casu, da licença-prêmio.

A aquisição do direito à licença-prêmio ocorre com o decurso do tempo de 5 anos sem que o servidor incorra em qualquer causa de interrupção do serviço, nos termos legais.

Reconhecidas as condições necessárias à aquisição do direito, a licença-prêmio é concedida pela administração pública através de publicação oficial, independentemente de requerimento do servidor público (art. 212 da Lei nº 10.261/68)

O gozo da licença-prêmio, por sua vez, é a efetiva fruição do direito adquirido pelo servidor, “observada a opção do funcionário e respeitado o interesse do serviço” (art. 213, § 1º, “2”).

3. Indenização da licença-prêmio não usufruída

A questão fundamental que se coloca, portanto, é se não apresentado qualquer pedido de gozo da licença-prêmio adquirida e, inativando-se o servidor público, perde-se o direito legalmente conquistado.

A resposta é NÃO. O servidor público inativo que tenha licenças-prêmios – além de férias ou qualquer outro afastamento regular – não perde o direito já reconhecido mas não usufruído. Por razões óbvias, uma vez aposentado, inexiste a possibilidade de gozo desses direitos.

Contudo, remanesce intacto o seu direito e a possibilidade de indenização em pecúnia pela Fazenda Pública, sob pena de enriquecimento sem causa por parte do Estado, independentemente do motivo da não fruição. Nesse sentido:

AÇÃO ORDINÁRIA – INDENIZAÇÃO POR LICENÇA PRÊMIO E FÉRIAS NÃO GOZADAS – POLICIAL MILITAR REFORMADO – DIREITO À FÉRIAS NÃO COMPROVADO. Se o servidor público em atividade deixou de gozar licença-prêmio que lhe era devida, é lícito concluir que tem de ser ressarcido pela importância em pecúnia correspondente àquele direito do qual não usufruiu – Acaso assim não fosse, seria hipótese de enriquecimento sem causa por parte da Administração Pública – Verba de caráter indenizatório sobre a qual não incide desconto previdenciário e nem retenção de Imposto de Renda – Recursos parcialmente providos”. ( Apelação/Reexame Necessário nº 0007532-17.2010.8.26.0053, 7ª Câmara de Direito Público do TJSP, Rel. Luiz Sérgio Fernandes de Souza. j. 16.05.2011, DJe 31.05.2011).

Importante observar que o valor das prestações deve ser calculado com base nos vencimentos vigentes na data da aposentadoria (art.  da Lei Complementar 1.048/2008).

4. Prescrição do direito à licença-prêmio ou férias

Ainda, que a contagem do período prescricional de ação judicial em face da Fazenda Pública – ou seja, o período no qual o servidor público pode requerer seus direitos que, em regra, é de 5 anos, nos termos do Decreto nº 20.910/32 – só tem início a partir da data de aposentadoria. Nesse sentido:

[…] A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é firme no sentido de que com a aposentadoria do servidor, tem início o prazo prescricional do seu direito de pleitear a indenização referente à licença-prêmio não gozada, conforme julgamento submetido ao regime dos recursos repetitivos no REsp 1.254.456/PE, de relatoria do Min. Benedito Gonçalves (DJe 02.05.2012). III – Antes da aposentação não há falar em prazo prescricional, porquanto o servidor em atividade não faz jus à conversão da licença prêmio em pecúnia, pois a regra é que a licença seja usufruída, ou mesmo contada em dobro para aposentadoria, surgindo a pretensão à indenização somente se não utilizada de nenhuma dessas formas, sob pena de enriquecimento da Administração […] ( AgInt no REsp n. 1.956.292/MG, relator Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, julgado em 22/8/2022, DJe de 24/8/2022.)

5. Conclusão

Portanto, se você é funcionário público já aposentado ou em vias de se aposentar, analise concretamente a possibilidade de converter o seu direito não usufruído em indenização pecuniária, de modo a não abdicar de um benefício já incorporado ao seu patrimônio jurídico.

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Rogério Mello

Rogério Mello

Advogado USP, Professor Universitário, Mestre em Direito, Doutor em Segurança Pública e Especialista em Direito Público e Militar